Prática melhora o foco e reduz a ansiedade dos alunos, dentro e fora da sala de aula
“Se todas as crianças de 8 anos aprenderem meditação, nós eliminaremos a violência do mundo dentro de uma geração” . A afirmação do monge budista Dalai Lama faz mais sentido do que nunca e está sendo levada a sério em algumas instituições de ensino do Rio. Colégios das redes pública e particular da cidade estão oferecendo exercícios de meditação para crianças e adolescentes durante o horário escolar. A prática, que estimula a observação e aguça a concentração, está conectando estudantes que se relacionam com um mundo cada vez mais agitado e repleto de estímulos externos. Mas, desta vez, a conexão não é virtual e, sim, interior.
Na Escola Municipal Dom Pedro I, na Barra da Tijuca, a instrutora de práticas contemplativas e mindfulness Bruna Andrade atua como voluntária, compartilhando a técnica com os alunos.
Durante a prática, que é acompanhada por uma música que tranquiliza, os adolescentes são guiados delicadamente pela instrutora, que chama a atenção para o ritmo da respiração, pede que eles tragam o pensamento para o presente e os induz a um relaxamento profundo.
— O meditador é um observador. Observa a respiração, o corpo, os sons e os pensamentos, que são como uma onda do mar, vêm e vão — orienta Bruna, que estimula o olfato, a audição, o paladar, a visão e o tato. — Sinta essa folha com seus dedos, toque de forma suave, porém atenta, observe a textura, explore a folha — propõe ela durante a prática, acompanhada pela reportagem.
Durante o exercício, alguns estudantes chegam a dormir. E já sentem no dia a dia os efeitos benéficos do mindfulness.
— Sou muito agitada, falo muito. Com a meditação, estou ficando mais calma e prestando atenção nos detalhes das coisas — diz a estudante Gabrielle Mesquita, de 15 anos.
Já o aluno Marcos Vinicio de Souza Costa, de 14 anos, passou a lidar melhor com o videogame.
— Moderei o tempo e, quando perco, fico mais tranquilo — reconhece.
Diretora do Pedro I, Andréa Leal está satisfeita com a novidade:
— Os alunos ficam mais focados na escola e aumentam o poder de observação. A meditação é um aprendizado para a vida.
Bruna é a prova viva dos efeitos benéficos da técnica. Formada em Marketing, fez carreira no mercado financeiro e trabalhou por 15 anos em diversos bancos. Depois de ter sua primeira filha, em 2010, seguiu conciliando as funções profissionais com o papel de mãe. Por causa do trabalho, passava muito tempo viajando, longe da família. A urgência de dar conta de tudo e a cobrança implacável foram tomando conta dela, que, simplesmente, entrou em colapso.
— Em 2013, desenvolvi um transtorno de ansiedade. Tive gastrite, não dormia bem, minha alimentação era irregular, não estava feliz. Resolvi abrir mão daquela carreira e ir embora para casa. Passei por um processo medicamentoso, comecei a fazer terapia, e o meu analista me indicou grupos de meditação.
E foi assim que Bruna viu sua vida mudar. A identificação com a meditação aconteceu de forma instantânea e a levou a conhecer outras vertentes do método, como o mindfulness, também conhecido como atenção plena. Além de se tornar uma praticante dedicada, fez um curso de especialização na PUC-Rio e passou a trabalhar como voluntária.
Gestora pedagógica da Escola Pedra da Gávea há quatro anos, Denise Martinez Pinto também é praticante de ioga e meditação há dez. No colégio, ela atua como facilitadora das práticas contemplativas e é a responsável por “nutrir” de informações os professores da escola, que proporcionam aos alunos, de 1 a 9 anos, momentos de ioga e de meditação.
— Não estipulamos um horário fixo, mas é preciso contemplar diariamente. O maior lucro da meditação é o autoconhecimento e a autorregulação. Eles aprendem a lidar com os sentimentos e a a ter maior controle das emoções desde cedo. Já tivemos o retorno de crianças que falaram assim: “eu estava nervoso e respirei” — relata.
Se na Pedra da Gávea o alvo são as crianças, no Colégio Bahiense são os adolescentes que estão no foco. A iniciativa partiu do professor de física e de matemática Thiago Narahari, que também é instrutor de meditação formado pela Escola Arte de Viver.
— Existem diversos tipos de meditação, do sol, da lua cheia, mindfulness. Ofereço uma técnica chamada meditação sem esforço. Para realizá-la, basta sentar com a coluna ereta e as mãos viradas para cima, fechar os olhos e guiar a respiração — diz o professor, que disponibiliza o exercício, que não é obrigatório, toda quarta-feira, durante o recreio, para os alunos do Ensino Médio. — Encontrei na meditação uma maneira de cuidar da saúde mental dos meus alunos.
Segundo o coordenador pedagógico do Colégio Bahiense, André Luiz de Souza Carnasciali, a resposta é positiva:
— Um aluno fala para o outro e a aula tem cada vez mais adeptos. No futuro, planejamos incluir a meditação na grade, a partir do Ensino Fundamental.
Especialista em Práticas Integradas Complementares e diretora do Instituto Brasileiro de Ayurveda (IBRATA), Ma Prem Ila acredita no poder da meditação desde a mais tenra idade.
— Músicas meditativas acalmam bebês — exemplifica.
No caso de adolescentes, que enfrentam uma rotina pesada de provas — principalmente aqueles que vão fazer o Enem —, o que gera muita ansiedade, Ma Prem Ila diz que quanto mais meditação, melhor.
— Melhora a capacidade mental de quem estuda e também auxilia pessoas com Transtorno do Déficit de Atenção (TDAH). A meditação atua de forma profunda na mente. E todos os tipos são válidos, não existe uma pior nem melhor.
Para quem não pode usufruir da meditação no ambiente escolar, a terapeuta integrativa sugere praticá-la em casa.
— Crianças a partir de 6 anos já podem começar com a orientação dos pais. Indico uma técnica simples, chamada Pranayama, que é a respiração pura. Grande parte das pessoas não sabe respirar. Ensinar a criança a respirar traz calma.
Fonte: O Globo